Chapadão do Sul/MS

 ARTIGO – De Watergate à Lava Jato. Os interesses de uma nação estão acima dos indivuais

Claudinei Poletti – Advogado

Inegavelmente as duas maiores operações desencadeadas no mundo para desvendar “crimes do colarinho branco”, foram, por ordem cronológica, a operação “Mãos Limpas” na Itália no início  dos anos 1990 e a operação “Lava Jato” no Brasil da segunda década do século XXI.

            Na verdade, a operação brasileira teve clara inspiração na italiana, sendo que os principais responsáveis por ela e, em especial, o Juiz Sérgio Moro, jamais negaram que haviam estudado a fundo a “Mãos Limpas”. Curiosamente os resultados, os acertos e desacertos e, infelizmente, a intervenção política, são praticamente idênticos.

            No entanto, apesar das críticas dirigidas aos condutores da “Lava Jato”, considerados por muitos (especialmente pelos culpados) como usurpadores dos direitos individuais, em específico em relação às delações premiadas, poucos traçaram parâmetros com situações em que as delações mudaram o rumo da história.

            Outro ponto em que proponho reflexão não se limita à “Lava Jato”, mas ao Judiciário, no caso específico, ao Supremo Tribunal Federal, alvo de críticas de todos os lados, desde a estrema esquerda à extrema direita. É fato que nossa Suprema Corte merece muitas das críticas que lhe são dirigidas, possivelmente a maioria, mas nem tudo são erros.

            Pois bem. Todos, de alguma forma, já ouviram falar do escândalo de Watergate, que levou à renúncia do Presidente Richard Nixon, até então um dos mais populares presidentes americanos (concluiu o primeiro mandato com 62% de aprovação). Evidentemente que Watergate, se comparado à “Lava jato”, deveria ser julgado no Juizado de Pequenas Causas ou nem isso, mas isso não é relevante.    

            Dois são os aspectos que possuem evidente semelhança com o que vivenciamos no Brasil: (i) a imposição de penas ou prisões para facilitar as delações; e (ii) a interferência da Suprema Corte no Executivo.

            A elas: Os procuradores da “Lava Jato” e, especialmente, Sérgio Moro, foram, e ainda são, acusados de abusarem das prisões preventivas ou temporárias para forçar os presos a delatarem. Embora sempre negado em público tanto pelos Promotores quanto pelos Juízes, isso de fato aconteceu. Mas isso é, efetivamente, um abuso, uma usurpação dos direitos individuais dos larápios?

            Nos Estados Unidos, no caso Watergate, os cinco “executores” das escutas ilegais na sede do Partido Democrata, mesmo presos, não delataram. Ao menos não até a prolação da sentença, que os condenou a penas que variavam de 35 a 45 anos de prisão. No entanto, na própria sentença, o Juiz John Sirica estabeleceu que a pena seria reduzida não a anos, mas a meses para quem delatasse. 

            Obviamente, a valentia acabou aí e as delações aconteceram, começando justamente pelo único ex-agente da CIA, James McCord. As delações levavam o escândalo para dentro da Casa Branca, mas não a Nixon, que numa espécie de: “não sei de nada” ou “foram os filhos”, negou qualquer participação e ofereceu a cabeça de colaboradores próximos, alguns fiéis escudeiros, com anos de lealdade canina.

            Entra então o segundo ponto. Nixon, como já haviam feito alguns antecessores, instalou escutas no salão oval e em outras partes específicas da Casa Branca, para que, no futuro, sua passagem pelo cargo mais poderoso do mundo fosse lembrado em detalhes. Tem-se, obviamente, documentos privados, pertencentes ao Presidente.

            No entanto, após pedido dos procuradores responsáveis por Watergate, a Suprema Corte Americana, por unanimidade, determinou que Nixon entregasse 64 conversas gravadas no salão oval, que tinham ligação direta com o escândalo. E esse foi o fator que levou à renúncia, em 09 de agosto de 1974, de Richard Milhous Nixon, o 37° Presidente Americano.

            Isso na mais sólida e próspera democracia do mundo moderno, sem que ninguém falasse em interferência entre os Poderes, ou de “impossibilidade de governar” diante das constantes interferências do STF, quando este determina a instalação de uma CPI, de acordo com a CF ou quando determina que num país democrático não pode haver “orçamento secreto”. Num futuro próximo, quando sigilos de “cem anos” começarem a cair, provavelmente dirão que, novamente, se estará diante de absurda interferência de poderes.  

            Esses fatos com certeza explicam um pouco o porquê um país é uma potência mundial e o outro trafega sempre no limite entre ser “emergente” ou subdesenvolvido.

            Também, já que poucos se atrevem a estabelecer parâmetros, escancara que, dependendo do lado de quem analisa a questão, vilões passam rapidamente a heróis injustiçados e mocinhos a bandidos (já tem gente, ou moluscos, querendo a prisão dos promotores e juízes da “Lava Jato”).

            Contudo, a história demonstra que, sim, é preciso respeitar direitos individuais, no entanto, quando há conflito entre estes e os interesses de toda uma nação, os últimos prevalecerão, ao menos no país mais poderoso do mundo, que muitos preferem taxar de imperialista.   

Claudinei Poletti – Advogado    

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